Depois de tanto falar de Hart, e da sua norma de reconhecimento, pergunta-se: porque é ela importante? Qual a relevância de saber de onde vem o Direito, como é que ele se torna legítimo, etc?
É uma questão até bastante simples mas para a qual me parece ser necessária uma resposta para completar os posts anteriores.
Basicamente o que se passa é que para o Direito ser visto como uma ciência, que o é - ou, de modo mais correcto, para a análise do Direito constituir uma ciência, é necessário que se processe de forma lógica e científica, por muito pleonásmico que possa parecer. Com esse intuito, Kelsen constrói o Direito uma uma série de premissas baseadas noutras, ou, mais uma vez, de modo mais preciso, uma série de normas jurídicas fundadas numa outra, hierárquicamente superior. O problema é quando chegamos ao topo, e verificamos que essa cascata, que percorremos agora em sentido ascendente, tem de parar. E Kelsen fá-lo com a grundnorm, a norma fundamental, hipotética e pressuposta. Não existe, não tem qualquer conteúdo ou função (pelo menos assim me parece) que não seja validar a norma imediatamente abaixo na cadeia hierárquica (normalmente, a constituição). O problema desta construção é a de que o Direito não apenas regula condutas, mas surge também da actividade humana e é nela que se funda e legitima. E as críticas feitas à concepção de Kelsen por ser demasiado formalista e afastada da realidade social subjacente ao Direito são vencidas por Hart, sem se perder essas mesmas inferências lógicas de norma em norma, formando um sistema lógico, que pode ser analisado como ciência.
O que Hart propõe é que essa norma fundamental, a norma original do sistema, aquilo a que ele chama norma de reconhecimento, seja fundada na convicção da população de que aquela pessoa, aquele órgão, o que for, deve ter legitimidade para legislar. E essa norma põe, no sentido técnico do termo, o sistema em acção. Ou seja, a Constituição ou qualquer norma que seja a norma hierarquicamente mais elevada (dentro das normas com conteúdo efectivo de conformação social) é legitimada e "posta" pela norma de reconhecimento. Assim, explica-se com um substracto social o sistema jurídico, salvaguarda-se a sua abordagem positivista e normativista sem pôr em causa o Direito como ordem do Homem para o Homem. Hart é assim dos maiores génios do Direito, ainda que, como cumpre dizer, as suas concepções provavelmente não teriam sido possível sem o extremismo de Kelsen que permitiu a expansão de horizontes em termos de definição do direito pela corrente positivista e normativista.
Fica a explicação, não muito precisa nalguns termos, mas de simples compreensão.
É uma questão até bastante simples mas para a qual me parece ser necessária uma resposta para completar os posts anteriores.
Basicamente o que se passa é que para o Direito ser visto como uma ciência, que o é - ou, de modo mais correcto, para a análise do Direito constituir uma ciência, é necessário que se processe de forma lógica e científica, por muito pleonásmico que possa parecer. Com esse intuito, Kelsen constrói o Direito uma uma série de premissas baseadas noutras, ou, mais uma vez, de modo mais preciso, uma série de normas jurídicas fundadas numa outra, hierárquicamente superior. O problema é quando chegamos ao topo, e verificamos que essa cascata, que percorremos agora em sentido ascendente, tem de parar. E Kelsen fá-lo com a grundnorm, a norma fundamental, hipotética e pressuposta. Não existe, não tem qualquer conteúdo ou função (pelo menos assim me parece) que não seja validar a norma imediatamente abaixo na cadeia hierárquica (normalmente, a constituição). O problema desta construção é a de que o Direito não apenas regula condutas, mas surge também da actividade humana e é nela que se funda e legitima. E as críticas feitas à concepção de Kelsen por ser demasiado formalista e afastada da realidade social subjacente ao Direito são vencidas por Hart, sem se perder essas mesmas inferências lógicas de norma em norma, formando um sistema lógico, que pode ser analisado como ciência.
O que Hart propõe é que essa norma fundamental, a norma original do sistema, aquilo a que ele chama norma de reconhecimento, seja fundada na convicção da população de que aquela pessoa, aquele órgão, o que for, deve ter legitimidade para legislar. E essa norma põe, no sentido técnico do termo, o sistema em acção. Ou seja, a Constituição ou qualquer norma que seja a norma hierarquicamente mais elevada (dentro das normas com conteúdo efectivo de conformação social) é legitimada e "posta" pela norma de reconhecimento. Assim, explica-se com um substracto social o sistema jurídico, salvaguarda-se a sua abordagem positivista e normativista sem pôr em causa o Direito como ordem do Homem para o Homem. Hart é assim dos maiores génios do Direito, ainda que, como cumpre dizer, as suas concepções provavelmente não teriam sido possível sem o extremismo de Kelsen que permitiu a expansão de horizontes em termos de definição do direito pela corrente positivista e normativista.
Fica a explicação, não muito precisa nalguns termos, mas de simples compreensão.
Etiquetas: Herbert Hart, norma de reconhecimento, Positivismo
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Autor
- Pedro Azevedo
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Bom dia!
O que não ficou claro é a diferença entre essas duas normas.